Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
- 2º Grau
Tribunal de Justiça de Minas Gerais TJ-MG: 0159225-34.2019.8.13.0105 MG - Inteiro Teor
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
GRUPO JURISDICIONAL DE GOVERNADOR VALADARES
ia TURMA RECURSAL
Processo
Recurso Inominado 0105.19.015922-5
Recorrente BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO
LUIZA DA SILVA FERREIRA
Recorrido LUIZA DA SILVA FERREIRA
BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO
Data do Julgamento 12 de maio de 2021
Horário 8h
Juízes
Relator Michel Cristian de Freitas
1º Vogal Anacleto Falci
2º Vogal Marcelo Carlos Cândido
Presenças
Promotor xxxxxx-x
Adv. do Recorrente xxxxxx-x
Adv. do Recorrido xxxxxx-x
Aberta a sessão, efetuou-se o pregão de estilo. Em seguida o MM. Juiz Presidente, Dr. Anacleto Falci, anunciou o julgamento.
O MM. Juiz relator proferiu o seu voto dando parcial provimento ao recurso interposto por Luiza da Silva Ferreira, e negando provimento ao recurso interposto por BV FINANCEIRA S/A, o qual segue em anexo.
1º Vogal: Divergiu do voto do para negar provimento ao recurso interposto Luiza da Silva Ferreira, e dar provimento ao recurso interposto por BV FINANCEIRA, nos termos do voto que segue anexo.
2º Vogal: De acordo com o 1º vogal.
SÚMULA: CONHECERAM DE AMBOS OS RECURSOS INTERPOSTOS. NO MÉRITO NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO • • R LUIZA DA SILVA FERREIRA, POR MAIORIA, NOS TERMOS DO VOT Do 1º VOGAL RELÁ ACOMPANHADO PELO 2º VOGAL, VENCIDO O OR.) E, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO POR BV FIN NCEI A S/A, POR Â MAIORIA, NOS TERMOS DO VOTO DO 1º VOGAL, ACOM ANH DO PELO 2º
VOGAL, VENCID ÉSULRELATOR.
C Anacleto Falci # 6º& elo Car s Cândido
Michel CripMn de Freitas
Jutde Direito Juiz de Direito Juiz de ireito
Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais
1' TURMA RECURSAL DE GOVERNADOR VALADARES
Autos : 0105.19.015.922-5
Classe : Cível — Ação Declaratória de Inexistência de Negócio Jurídico c/c Obrigação
de Fazer e Reparação Civil por Danos Morais
Origem : JESP MANTENA/MG
Recorrentes : 1º RECORRENTE — LUIZA DA SILVA FERREIRA
2º RECORRENTE — BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO Recorridas : BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO e outros
Relator : Juiz Michel Cristian de Freitas
VOTO DO RELATOR
Infere-se dos autos que em sentença de ff. 105/108-TR, o magistrado primevo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais ajuizados por LUIZA DA SILVA FERREIRA, em face de BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO, a fim de declarar a inexistência do débito que se encontrava em aberto, bem como condenar a ré a proceder com a reativação do contrato de nº 234510226 e a restituir a autora a quantia de R$522,00 (quinhentos e vinte e dois reais) a título de danos materiais.
A primeira Recorrente, LUIZA DA SILVA FERREIRA, interpôs recurso inominado às ff. 109/113-TR, pugnando pela reforma parcial dar. sentença de primeiro grau, apenas para que a 2º recorrente/ré seja condenada pelos danos morais causados à autora.
A segunda Recorrente, BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO, interpôs recurso inominado às ff. 114/125-TR, pugnando pela reforma in totum da r. sentença objurgada, para que todos os pedidos contidos na inicial sejam julgados improcedentes.
É o sucinto relatório.
Conheço de ambos os recursos, pois próprios, tempestivos e provido de preparo o recurso da 2º Recorrente — BV Financeira S/A de Crédito Financiamento.
Defiro nesta oportunidade os benefícios da gratuidade judiciária a ia Recorrente — Luiza da Silva Ferreira.
1— Da Preliminar de Incompetência dos Juizados Especiais
De inicio, deve ser afastada a preliminar de incompetência do Juizado Especial Cível arguida pela 2º Recorrente, uma vez que não se mostra necessária a realização de prova técnica para o deslinde da questão posta a julgamento.
Ademais, cediço que o Juizado Especial Cível é regido pelos princípios pas de nullite sans grief, instrumentalidade das formas e celeridade, e, sendo as provas dos autos suficientes para o julgamento da lide, é facultado ao magistrado o indeferimento de provas
Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais
a TURMA RECURSAL DE GOVERNADOR VALADARES
que considerar inúteis e/ou desnecessárias — a teor do que dispõe o art. 370, parágrafo único, do NCPC —, mormente porque o Juiz é o destinatário final das provas, vigorando no Direito Brasileiro o Princípio da Livre Apreciação das Provas.
Mediante tais considerações, rejeito a preliminar eriçada.
Não havendo outras preliminares arguidas, e por se tratar de pedidos recursais de natureza dúplice, passo a análise do mérito de ambos os recursos
Cotejando detidamente os autos, reputo que as alegações da 1º Recorrente merecem parcial acolhimento, em razão do que passo a expor.
Ah initio, é certo que a relação jurídica de direito material deduzida nestes autos está enquadrada como relação de consumo, de conformidade com o preceituado no art. 3 0 , § 2º, da Lei nº 8.078 de 1990, sendo inegável a incidência das regras do Código de Defesa do Consumidor.
Por se tratar de relação de consumo, serem verossímeis as declarações da 1º Recorrente, em face do princípio de que não é cabível a exigência de prova negativa (prova diabólica), se mostra acertada a inversão do ônus da prova, tal como previsto no artigo 6º, VIII, do Código de Defesa de Consumidor.
A par disto, verifica-se que a 2º Recorrente não logrou êxito em provar a higidez do pacto contratual que originou os descontos no beneficio previdenciário da autora, pois deixou de coligir documento escrito que estivesse revestido das formalidades legais necessárias para a contratação em comento.
Nesse sentido, impende ressaltar que conforme documento carreado à f. 07-TR, a Recorrente é analfabeta, não sabendo sequer grafar o próprio nome, não podendo essa firmar contrato de forma legítima com a 2º — Recorrente sem ao menos o prévio conhecimento de seu procurador.
Desse modo, ainda que o contrato entabulado entre as partes tenha sido realizado perante duas testemunhas, como foi sustentado pela instituição ré, houve insegurança na contratação dos empréstimos em nome da Autora/recorrente, uma vez que sendo pessoa analfabeta, seria indispensável que o contrato estivesse formalizado por instrumento público ou, se por instrumento particular, através de procurador devidamente constituído por instrumento público, conforme inteligência dos artigos 37, 1º, da Lei 6.015/73 c/c art. 104, III e art. 166, IV, do Código Civil—, que não ocorreu no caso dos autos.
Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais
ia TURMA RECURSAL DE GOVERNADOR VALADARES
Nesse contexto, o que se conclui, então, é que, apesar de alegar fato impeditivo do
direito da autora/recorrente, a 2º — Recorrente não se desincumbiu do ônus probatório que lhe
é imposto pelo art. 373, II, do CPC/15, já que não trouxe, aos autos, documento capaz de
comprovar a existência da relação jurídica válida e regular entre as partes apta a legitimar os
descontos no benefício previdenciário da 1º — Recorrente.
Nesse mesmo sentido, colaciona-se a seguinte ementa do e. Tribunal de Justiça de
Minas Gerais:
EMENTA: APELAÇÃO Cá/EL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO -EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO RECEBIDO PELO INSS - PESSOA ANALFABETA -DANO MORAL - CONFIGURADO - MINORAÇÃO -IMPOSSIBILIDADE.
- O contrato materializado na forma escrita por pessoa analfabeta
para ter validade é necessário que seja ratificado por representante legal constituído pelo analfabeto por meio de instrumento público. - É fato gerador de dano moral os descontos indevidos em proventos de aposentadoria.
- O valor da indenização a título de dano moral deve ser fixado em observância da natureza e da intensidade do dano, da repercussão no meio social, da conduta do ofensor, bem como da capacidade econômica das partes envolvidas. (TJMG - Apelação Cível 1.0352.18.002895-8/001, Relator (a): Des.(a) Pedro Aleixo , 16' CÂMARA CÍVEL, julgamento em 17/07/2019, publicação da sumula em 26/07/2019) (g.n.)
Logo, resta patente, a conduta extremamente grave do banco réu, sendo certo que
a privação da recorrente de boa parte dos recursos indispensáveis à própria sobrevivência
certamente ultrapassou os meros aborrecimentos da vida moderna, ensejando,
consequentemente, o dever de indenizar pelos danos morais por ela suportados.
Quanto a fixação do quantum indenizatório, destaco que no dever de reparação
por danos morais deve ser levado em consideração os princípios da proporcionalidade e
razoabilidade, bem como o valor da indenização deve servir como alerta para que a 2º —
Recorrente passe a agir com maior cautela em casos semelhantes (efeito pedagógico, punitivo
e compensatório) e, em contrapartida, não pode se constituir em enriquecimento indevido por
parte da 1º — Recorrente, que deve ser reparada na medida mais próxima possível do abalo
moral efetivamente experimentado, tendo-se em vista, também, a condição econômica e
Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais
1 a TURMA RECURSAL DE GOVERNADOR VALADARES
Logo, tenho que a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) adequa-se aos limites da razoabilidade e proporcionalidade ao caso concreto.
Ex positis. DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO intentado por Luiza da Silva Ferreira e CONDENO a 2º Recorrente — BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO a ressarcir a autora a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais, devendo estes serem devidamente corrigidos pelos índices da tabela da CG-TJMG, a partir do arbitramento do r. acórdão (Súm. 362, do STJ), e acrescidos de juros de mora de I% (um por cento) ao mês a partir do evento danoso (Súm. 54, do STJ), ou seja, a partir do primeiro desconto indevido. Deixo de condenar a 1º Recorrente em custas e honorários de sucumbência ante a falta de amparo legal — art. 55 da Lei 9.099/95.
NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto pela 2º Recorrente — BV Financeira S/A de Crédito Financiamento, condenando-a ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocaticios a parte autora, Que fixo em 20% sobre o valor atualizado da condenação, com fulcro no art. 55 da lei 9.099/95.
É COMO voto.
Governador Valadares/MG, de 2021.
Michel Crist' n de Freitas
JudRelator
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
V Turma Recursal da Comarca de Governador Valadares
RECURSO INOMINADO N' 0159225-34.2019.8.13.0105
Vistos, etc.
Dispensado o relatório, na forma do art. 38 da Lei 9.099/95.
LUIZA DA SILVA FERREIRA afirmou que não novou seu contrato de empréstimo realizado com a BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO.
BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, por sua Vez, afirmou que o refinanciamento é licito, uma vez que decorre do contrato de fls. 87/91.
Em que pese LUIZA DA SILVA FERREIRA ter afirmado que não refinanciou sua dívida, entendo que os documentos de fls. 87/91 são suficientes para demonstrar a efetiva novação.
Apesar de LUIZA DA SILVA FERREIRA ser pessoa iletrada, os autos demonstram que esta não estava em situação de vulnerabilidade quando da celebração do contrato: a avença em questão possui a sua impressão digital, acompanhada de duas testemunhas, nos termos do art. 595 do CC/02, sendo que uma das testemunhas que assinou o refinanciamento questionado é seu filho, GILMAR DA SILVA FERREIRA, conforme comprova documento de identidade de fls. 94 e 94-v"
Além disso, chama-se a atenção para o fato de LUIZA DA SILVA FERREIRA ser autora de outros 2 (dois) processos apensos a este, os quais, estranhamente, discutem 2 mesma questão aqui debatida.
O fato de LUIZA DA SILVA FERREIRA ser iletrada não possui o condão, por si só, de nulificar o contrato por ela firmado, pois, o analfabetismo não constitui presunção de incapacidade da pessoa, consoante se denota dos arts. 3º e 4º do Código Civil.
No meu modo de entender, a conjugação destes fatores afasta a suposta" situação de vulnerabilidade "dela no momento da contração. Nota-se, inclusive, que em momento algum LUIZA DA SILVA FERREIRA afirmou ter sido"enganada ou iludida"por algum parente seu ou pessoa da sua confiança.
rãrfricr
Dessa forma, ante a ausência de hipervulnerabilidade de LUIZA DA SILVA FERREIRA, restando evidente que ela não só quis, mas, efetivamente, contratou e aderiu à avença discutida nos autos, a improcedência dos pedidos iniciais é medida que se impõe.
Nesses termos:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM -CERCEAMENTO DE DEFESA - DEPOIMENTO PESSOAL - EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - -CONTRATAÇÃO COMPROVADA - DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO IMPROCEDENTE. 1-Rejeita-se a preliminar de cerceamento de defesa em razão de indeferimento do depoimento pessoal da parte autora se a prova documental carreada aos autos é suficiente para a solução da controvérsia. 2- É válida a contratação de empréstimo bancário por pessoa analfabeta quando na sua presença tem assinatura a rogo da filha e assinatura de duas testemunhas e disponibilizado o crédito em sua
conta bancária, não comprovada fraude ou qualquer outro vicio que invalide o contrato. 3. Comprovada a regularidade da contratação os pedidos de declaração de inexistência e inexigibilidade de débitos devem ser julgados improcedentes. (11MG -Apelação Cível 1.0352.18.000294-6/001, Relator (a): Des.(a) Jose Flávio de Almeida, 12 CÂMARA CÍVEL, julgamento em 31/0 7 / 2019, publicação da sumula em 08/08/2019).
Anota-se que esta 1" TR., nesta atual composição de Juizes Titulares, já sufragou o mesmo entendimento ora novamente esposado: vide RECURSO INOMINADO Nº 0024528-76.2019.8.13.0105 - RECORRENTE (S): MARIA APARECIDA PARALON e CCB BRASIL S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTOS E INVESTIMENTOS RECORRIDO (A)(S): MARIA APARECIDA PARALON e CCB BRASIL S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTOS E INVESTIMENTOS - julgamento em 06/12/2019; RECURSO INOMINADO Nº 0212776-26.2019.8.13.0105 RECORRENTE (S): MARIA DAS GRAÇAS DA SILVA e BANCO OLÉ BONSUCESSO CONSIGNADO S/A RECORRIDO (A)(S): MARIA DAS GRAÇAS DA SILVA e BANCO OLÉ BONSUCESSO CONSIGNADO S/A -julgamento na em 27/01/2020.
Ante o exposto, e depois de considerar o mais que dos autos consta, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DA BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO para julgar improcedentes os pedidos iniciais e, por conseguinte, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO DE LUíZA DA SILVA FERREIRA.
Governador Valadares/MG, 12 de maio de 2021.
4
ANACLETO FALCI
Juiz de Direito - 1' Vogal