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19 de Maio de 2024
  • 1º Grau
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TJMG • XXXXX-07.2013.8.13.0024 • Tribunal de Justiça de Minas Gerais - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de Minas Gerais
há 9 anos

Detalhes

Processo

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Processo: XXXXX-07.2013

Ação Declaratória com Pedido de

Exumação dos restos mortais do corpo

do senhor Geraldo Ribeiro

Requerente: Câmara Municipal de São

Paulo

Requeridas: Maria de Lourdes Ribeiro

e Elza Lúcia Ribeiro Silva

4ª Vara da Fazenda Pública Municipal

Comarca de Belo Horizonte MG

Trata-se de ação declaratória, ajuizada pela Câmara Municipal de São Paulo, representada por seu Presidente José Américo, por solicitação da Comissão da Verdade Vladimir Herzog, instituída através da Resolução nº 02, de 06 de março de 2013, na qual se requer a expedição de alvará judicial para que seja autorizada a exumação, para fins de perícia técnica, das ossadas do senhor Geraldo Ribeiro, sepultado no Cemitério da Saudade, lote 230, carneiro 01, seção C, ao argumento de que ele era o motorista do carro que conduzia o Presidente Juscelino Kubitschek, em 22/08/1976, que se envolveu em um acidente fatal, que culminou com a morte de ambos.

Informa a requerente que de acordo com a versão oficial, a causa do acidente foi a colisão entre o veículo do Presidente e um ônibus da Viação Cometa.

Alega sua capacidade judiciária, na medida em que o presente caso versa sobre a defesa de interesses e prerrogativas do Parlamento, reputando que trabalhar pela consolidação do regime democrático representa um dos interesses e prerrogativas primários do Poder Legislativo, e que pairam muitas dúvidas sobre os fatos ocorridos no período da ditadura, que devem ser esclarecidos, visando assegurar a verdade histórica e a difundir a importância dos Direitos Humanos.

Informa que após o Brasil ter sido condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos a adotar providências para a recuperação da verdade histórica, no caso Júlia Gomes Lund (Guerrilha do Araguaia), contra a República Federativa do Brasil, foi criada a Comissão Nacional da Verdade (lei nº 12.528/11), com o objetivo de examinar e esclarecer as graves violações aos direitos humanos praticadas no período da ditadura militar.

Afirma que como é de conhecimento, na tarde de domingo do dia 22/08/1976, o Presidente Juscelino Kubitschek iniciou viagem de São Paulo rumo ao Rio de Janeiro, mas, no Km 02 da rodovia Presidente Dutra, sofreu um acidente fatal.

Alega que em 13/08/2013 foram tomados depoimentos relativos à morte do Presidente Juscelino na Comissão Vladimir Herzog, em que foram levantados diversos aspectos incongruentes, em especial: a) a parada do Presidente, minutos antes do acidente, no então “Hotel SNI”, de propriedade de um Brigadeiro do Exército, fundador do SNI e assessor do Ministro Golbery; b) sentença de absolvição penal do motorista do ônibus da viação Cometa, com vários testemunhos negando a colisão com o veículo acidentado, enquanto a versão oficial de colisão do ônibus no carro foi mantida; c) as fotos dos corpos de Geraldo Ribeiro e do Presidente não foram juntadas à perícia; d) a perícia que analisa a compatibilidade da tinta do ônibus não está assinada; e) hipótese não comprovada de projétil, definido como “prego de caixão”, no crânio de Geraldo Ribeiro; f) troca de peritos; g) depoimento do motorista do ônibus confirmando que não houve colisão com o carro, mas que, na época, foi procurado por duas pessoas que pretendiam lhe dar uma “mala de dinheiro” para confirmar que houve colisão; g) ausência de exames, tipo RX, no corpo de Geraldo Ribeiro, mas que foram realizados no corpo do Presidente; h) no cemitério, o corpo de Juscelino permaneceu no chão, sob um lençol, enquanto o corpo de Geraldo foi colocado em urna fechada.

Destaca trecho de depoimento e relata fato noticiado pela imprensa à época, sobre a morte de Juscelino Kubitschek e do político chileno Letelier, supostamente alvos da “Operação Condor”, sendo que na morte deste já ficou comprovado que se tratou de um atentado, e que o autor intelectual do crime, o General Contreras, foi condenado por esse crime.

Reitera que os fatos apontam incongruência nos fatos e perícias, em especial da exumação do cadáver do motorista, em 1996, em que não houve exame no corpo de Geraldo Ribeiro, e cita outros trechos de depoimentos, que entende tornarem as suspeitas muito verossímeis.

Elenca os procedimentos e processos para apuração da morte do Presidente Juscelino Kubitschek.

No mérito, busca autorização judicial para a exumação das ossadas de Geraldo Ribeiro, diante da suspeita de que ele foi atingido por projétil, e de que tal fato causou o acidente que vitimou o Presidente, e porque atualmente há maiores condições tecnológicas para se averiguar a existência ou não de vestígio de projétil.

Salienta que o efeito jurídico esperado é a obtenção de meios para efetuar a reconstrução da História, para o qual depende de autorização judicial, nos termos do artigo , do decreto municipal nº 12.009/05.

Requer a expedição de alvará judicial para que seja autorizada a exumação das ossadas de Geraldo Ribeiro, visando à realização de perícia técnica para o esclarecimento de dúvidas existentes acerca da causa da sua morte.

Atribui à causa o valor de R$ 100,00 e junta documentos.

O Ministério Público se manifestou nos autos, afirmando que se trata de caso de relevo social nacional, evidenciando-se o interesse público primário, a atrair a intervenção ministerial como custos legis.

Afirmou que, nos termos do artigo 1.105, do Código de Processo Civil, deveriam ser citados o Ministério Público, bem como os demais interessados, razão pela qual entendeu ser de rigor a citação dos familiares de Geraldo Ribeiro.

Pugnou pela intimação da Câmara Municipal de São Paulo para providenciar a adequação procedimental, e requereu que fossem cientificadas sobre o processamento do feito tanto a Comissão Nacional da Verdade, quanto a Comissão da Verdade do Estado de Minas Gerais (fls. 339/347).

Na decisão de fls. 348/349-v, foi reconhecida a legitimidade ativa da Câmara Municipal de São Paulo, bem como foi determinada a emenda da inicial para a indicação e anuência dos parentes de Geraldo Ribeiro, ou não havendo, ou inexistindo a concordância, que o procedimento se adequasse à jurisdição contenciosa, além de esclarecimentos quanto ao local da realização da perícia.

A Câmara Municipal de São Paulo informou que localizou uma filha de Geraldo Ribeiro, a advogada Maria de Lourdes Ribeiro, inscrita na OAB/RJ sob o nº 22.470, e que não havia naquela Seção autorização para fornecer dados da profissional.

Ressalvou que embora admita a dor de rememorar o acidente, Geraldo Ribeiro é um personagem importante para descortinar esse capítulo da História do Brasil, o que contará com a ajuda da filha Maria de Lourdes Ribeiro.

Requereu que fosse expedido ofício à OAB/RJ, situada à Avenida Marechal Câmara, nº 150, CEP XXXXX-080, Rio de Janeiro-RJ, para que fornecesse a este Juízo o endereço de Maria de Lourdes Ribeiro, com sua consequente intimação.

Informou que a perícia seria realizada na sede da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, no seu Departamento de Patologia (fls. 350/354).

Diante de certidão lançada à fl. 355, noticiando que a filha de Geraldo Ribeiro, Maria de Lourdes Ribeiro, informou seu endereço para possível intimação, determinou-se a emenda da inicial (fls. 356/357).

A autora emendou a inicial para requerer a citação dos parentes de Geraldo Ribeiro, suas filhas Maria de Lourdes Ribeiro e Elza Lúcia Ribeiro Silva (fls. 357/358).

Foi determinada nova emenda da inicial, para adequação do procedimento para o de jurisdição contenciosa (fls. 359/359-v).

A autora emendou a inicial para requerer a alteração do rito para o de jurisdição contenciosa (fls. 360/361).

Foram regularmente citadas Maria de Lourdes Ribeiro (fls. 382/386), e Elza Lúcia Ribeiro Silva (fls. 394/396).

Maria de Lourdes Ribeiro e Elza Lúcia Ribeiro Silva contestaram o pedido da autora (fls. 397/413), alegando em preliminar a falta de interesse de agir pela perda de objeto da ação, uma vez que já foi apresentado o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, e que o acordo de cooperação técnica firmado com a Comissão da Verdade do Município de São Paulo Vladimir Herzog, em abril/2014, se exauriu com a entrega do mencionado relatório final.

Aduziram que a Comissão Nacional da Verdade concluiu que o Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira e seu motorista Geraldo Ribeiro morreram em decorrência das lesões contundentes sofridas quando da colisão frontal entre o veículo em que viajavam e o veículo Scania Vabis”, e que “a cabeça de Geraldo Ribeiro não foi atingida por projétil expelido por arma de fogo”.

Também arguiram preliminar de ilegitimidade ativa, considerando que a Comissão da Verdade do Município de São Paulo foi criada para investigar e esclarecer fatos relacionados ao chamado “Caso Juscelino Kubitschek”, uma vez que tanto sua criação, quanto o acordo de cooperação técnica foram efetuados para esclarecer as graves violações de direitos humanos ocorridos no âmbito do seu território, enquanto o acidente que vitimou o Presidente e seu motorista ocorreu no Município de Resende/RJ.

Em ambos os casos, requereram a extinção do processo sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil.

No mérito, informaram que não concordam com a segunda exumação do corpo de seu pai, por entenderem que se trata de diligência inútil para o fim pretendido pela autora, refutando as alegações da Câmara Municipal, ao argumento de que a perícia realizada em 1996 concluiu que o objeto metálico encontrado no crânio de Geraldo Ribeiro é uma liga de ferro, sem presença significativa de chumbo na calota craniana, o que afasta a possibilidade de tratar-se de projétil de arma de fogo, provavelmente alojado quando do traslado dos restos mortais, e que se tratava de um cravo metálico, utilizado para fixar o forro do caixão, o que foi confirmado pela Comissão Nacional da Verdade.

Aduziram que o referido objeto, após a primeira exumação, foi enviado para Resende/RJ e arquivado no Inquérito Policial nº 273/96 da 89ª DP.

Informaram que a testemunha Paulo Oliver esclareceu que o “clarão” que diz ter visto ocorreu depois do choque do veículo com a carreta, sendo um início de incêndio, apagado pelo motorista do ônibus.

Afirmaram que o suposto buraco de bala no crânio de seu pai não foi confirmado pela Comissão Nacional da Verdade, o que inclusive foi comprovado por fotografias da perícia, e da primeira exumação.

Acrescentaram que as informações relativas aos restos mortais de Geraldo Ribeiro foram colhidas quando da exumação de 1996, e estão disponíveis para consulta e análise.

Colacionaram jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, para sustentarem que a exumação – que impõe especial sofrimento à família do exumado – é desnecessária quando existirem nos autos outros elementos de prova referentes ao que se pretende provar e, neste caso, estão juntados laudos periciais do corpo de Geraldo Ribeiro, além de fotos e exames realizados na primeira exumação de seus restos mortais, que permitem concluir que ele não foi alvejado por projétil de arma de fogo, e invocaram a possibilidade de realização de perícia indireta.

Concluíram que não há justa causa para uma segunda exumação.

Requereram o acolhimento das preliminares, com a extinção da ação sem resolução do mérito, ou a improcedência do pedido de exumação de Geraldo Ribeiro. Protestaram pela produção de provas e juntaram documentos (fls. 414/552).

A Câmara Municipal de São Paulo replicou (fls. 555-558), alegando que os trabalhos da Comissão da Verdade Vladimir Herzog – CVVH não estão voltados unicamente aos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade – CNV, sendo o acordo firmado com esta apenas uma das providências buscadas dentro dos parâmetros definidos pela CVVH para guiar suas atividades, em busca da eficiência constitucional, que deve nortear a atuação do Poder Público, mas ressalta que esta não está subordinada àquela.

Por isso, afirma que não pode o “caso Juscelino Kubitschek” ser dado por solucionado sem que se esgotem todos os meios de investigação quanto às dúvidas sobre a versão oficial acerca da morte do Presidente.

Quanto à competência territorial, sustenta que a viagem do Presidente se iniciou na cidade de São Paulo, razão pela qual entende que deve ser investigado o envolvimento dos órgãos de repressão situados em solo paulistano, em relação à sua morte.

Aduz não restarem elucidados pela Comissão Nacional da Verdade todos os aspectos levantados na inicial.

Reclama pela necessidade de nova oitiva de testemunhas ouvidas em outras oportunidades, diante do contexto atual e do objetivo visado com tais depoimentos.

Insiste em que não houve perda do objeto da ação, restando claro que a Comissão Nacional da Verdade definiu um método para seus trabalhos, pelo qual chegou à conclusão que não partilha a CVVH.

Aduz ser seu objetivo a obtenção de autorização judicial para realização de perícia técnica para investigar a possibilidade de que Geraldo Ribeiro tenha sido alvejado por projétil de arma de fogo, e para apurar se a morte de Juscelino Kubitschek foi um atentado e não um acidente.

Acrescenta basear-se o pedido formulado nas lacunas e nas incongruências detectadas no caso pela CVVH, durante a apuração realizada.

Assevera não se tratar o pedido de tentativa de exploração política do evento, argumentando ser a repercussão de referido caso consequência natural da pessoa pública nele envolvida.

Reitera os termos da inicial, pedindo pela procedência de seu pedido. Junta documentos.

Não foram requeridas provas.

O Ministério Público apresentou parecer (fls. 634-658), opinando pela improcedência do pedido inicial, tendo em vista a preliminar de ilegitimidade ativa da Câmara Municipal de São Paulo, afirmando que a capacidade processual de uma Câmara Municipal é conferida exclusivamente quando o Órgão pretende defender direitos relativos ao seu funcionamento e suas prerrogativas.

Entende que as Câmaras Municipais não possuem personalidade jurídica, mas judiciária, de modo que não há capacidade processual para figurar em relações processuais.

Acrescenta que a Comissão da Verdade Vladimir Herzog não possui autorização legislativa para pugnar o objeto desta demanda, e aduz que seus trabalhos se norteiam pela interação democrática com a Comissão Nacional da Verdade, e infere que as funções da CVVH são restritas.

Argui preliminar de falta de interesse processual, visto que a Comissão Nacional da Verdade apresentou relatório sobre a investigação que conduziu sobre o “Caso JK”, havendo conclusões sobre a morte de Geraldo Ribeiro.

Entende que há laudo conclusivo pela CNV, ao qual a CVVH está atrelada, de modo que ficou prejudicado o objeto da presente ação declaratória.

No mérito, menciona o artigo 12, do Código Civil Brasileiro, no concernente aos direitos da personalidade, estendendo estes direitos ao cadáver, em caso de ofensa física e moral.

Aduz a legitimidade dos cônjuges e parentes para velarem pela manutenção desses direitos de personalidade do ente falecido, sustentando que a hipótese que se aproxima à dos autos é a de atentado ao cadáver legitimado pelo direito de prova, todavia esta não se configura, pois não é comprovada nos autos a necessidade de se proceder uma nova exumação da ossada de Geraldo Ribeiro (fls. 634/658).

Relatei.

Decido.

Trata-se de requerimento de exumação dos restos mortais do corpo do senhor Geraldo Ribeiro, motorista do Presidente Juscelino Kubitschek, sendo que ambos morreram no dia 22 de agosto de 1976.

A requerente requer a exumação para fins de perícia técnica das ossadas do senhor Geraldo Ribeiro, sepultado no Cemitério da Saudade, lote 230, carneiro 01, seção C, situado à Rua Cametá nº 585, nesta Capital.

Alega a requerente que há diversos aspectos não esclarecidos e várias incongruências na versão oficial sobre a morte do Presidente, gerando fortes indícios de que possa ele ter sido mais uma vítima da violência nos anos em que vigorou a ditadura militar, fatos estes que somente poderão ser esclarecidos por meio da realização de uma nova perícia baseada na moderna tecnologia existente.

Antes de adentrar no mérito do pedido, passo à analise das preliminares suscitadas pelas partes.

Preliminar de falta de interesse de agir pela perda do objeto da ação – conclusão do Caso Juscelino Kubitschek pela Comissão Nacional da Verdade.

A finalização e apresentação do relatório pela Comissão Nacional da Verdade, não impede que a Câmara Municipal de São Paulo continue a investigar a morte do Presidente Juscelino Kubitschek, caso queira, e assim continuará a subsidiar a atuação da mencionada comissão.

Em caso de novas provas ou fatos novos sobre a matéria, nada impede que seja constituída nova Comissão Nacional da Verdade para que se continue a apurar os fatos em comento, ou que a mesma comissão seja constituída novamente.

As indenizações por atos praticados com violações dos direitos humanos são imprescritíveis, sendo as apurações podem continuar, caso seja necessário. Vejamos a jurisprudência:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA E TORTURA DURANTE O REGIME MILITAR. IMPRESCRITIBILIDADE DE PRETENSÃO INDENIZATÓRIA DECORRENTE DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS DURANTE O PERÍODO DE EXCEÇÃO. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.º DO DECRETO N.º 20.910/32. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC QUE NÃO SE VERIFICA. CONFIGURAÇÃO DA CONDIÇÃO DE ANISTIADO E REDUÇÃO DA VERBA INDENIZATÓRIA. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DIRIMIU A CONTROVÉRSIA COM BASE NO ACERVO PROBATÓRIO DOS AUTOS. REFORMA DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ.

1. Constatado que a Corte de origem empregou fundamentação adequada e suficiente para dirimir a controvérsia, é de se afastar a alegada violação do art. 535 do CPC.

2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que "As ações indenizatórias por danos morais e materiais decorrentes de atos de tortura ocorridos durante o Regime Militar de exceção são imprescritíveis. Inaplicabilidade do prazo prescricional do art. do Decreto 20.910/1932." (EREsp nº 816.209/RJ, Relatora Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, in DJe 10/11/2009). Isso, porque as referidas ações referem-se a período em que a ordem jurídica foi desconsiderada, com legislação de exceção, havendo, sem dúvida, incontáveis abusos e violações dos direitos fundamentais, mormente do direito à dignidade da pessoa humana. Precedentes: REsp XXXXX/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, Dje 29/9/2009; AgRg no Ag XXXXX/MG, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJe 12/11/2008; REsp XXXXX/PE, Rel. Ministro Franciulli Netto, Segunda Turma, DJ 30/6/2003.

3. O Tribunal a quo, analisando os fatos da causa, concluiu que houve inequívoca "perseguição política", estando, portanto, preenchidos os requisitos para se obter a reparação de danos prevista na lei, e inverter essa conclusão, bem como discutir a pretendida redução da verba indenizatória, implica incursão no universo fático probatório dos autos, o que é vedado em razão do óbice contido no enunciado nº 7 da Súmula do STJ.

  1. Agravo regimental não provido”

Nos termos do artigo 1º, da Resolução 08/13, a Comissão da Verdade do Município de São Paulo tem o objetivo de integrar, complementar e colaborar com a Comissão Nacional da Verdade. Rejeito a preliminar.

Preliminar de falta de legitimidade pela não abrangência territorial da Comissão Vladimir Herzog sobre os eventos do “Caso Juscelino Kubitschek”.

Como bem ponderado pela Câmara Municipal, a viagem do Presidente Juscelino Kubitschek se iniciou no Município de São Paulo, o que dá margem para que a Câmara Municipal investigue se eventual crime praticado contra ele foi planejado ou executado naquela Capital. Rejeito a preliminar.

Preliminar de ilegitimidade de parte suscitada pelo Ministério Público.

A Câmara de Vereadores não possui personalidade jurídica, mas apenas personalidade judiciária, de modo que somente pode demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais, entendidos esses como sendo os relacionados ao funcionamento, autonomia e independência do órgão.

Vejamos a lição de Hely Lopes Meirelles:


"A capacidade processual da Câmara para a defesa de suas prerrogativas funcionais é hoje pacificamente reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência. Certo é que a Câmara não tem personalidade jurídica, mas tem personalidade judiciária. Pessoa jurídica é o Município. Mas nem por isso se há de negar capacidade processual, ativa e passiva, à Edilidade, para ingressar em juízo quando tenha prerrogativas ou direitos a defender."MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, 14. ed. atual. por Márcio Schneider Reis e Edgard Neves da Silva, São Paulo, Malheiros Editores, 2006, pp. 612/613 .

A Câmara Municipal entendeu que é necessária a exumação do corpo do senhor Geraldo Ribeiro, durante a realização de uma Comissão da Verdade Municipal, para apurar a sua morte e a do Presidente Juscelino Kubitschek, o que torna a providência requerida necessária ao funcionamento da Comissão e da própria Câmara Municipal. Rejeito a preliminar.

Preliminar suscitada pelo Ministério Público, de falta de interesse processual.

Essa preliminar é idêntica a primeira preliminar apresentada pelas requeridas e já analisada nesta sentença. Rejeito-a.

A extinção da Comissão Municipal da Verdade Vladimir Herzog não tem o condão de causar a automática extinção desta ação, pois conforme dito anteriormente, a Câmara Municipal e o Congresso Nacional podem voltar a apurar os mesmos fatos, sendo que a ausência de decisão neste processo poderá causar prejuízo irreparável para as requeridas.

No meu entendimento, deve ser aplicado analogicamente ao caso o estatuído no artigo 249, § 2º, do Código de Processo Civil, razão pela qual passo a analisar o mérito do pedido.

Mérito.

Passados quase quarenta anos da morte do Presidente Juscelino Kubitschek, ainda se discute o que ocorreu no fatídico dia 22 de agosto de 1976, e se ele e seu fiel motorista foram vítimas de um acidente, ou se foram assassinados.

Analisarei os acontecimentos pelas provas que foram juntadas aos autos pelas partes, pois o juiz deve julgar o processo com o que consta nos autos.

Segundo apurado, o Presidente Juscelino Kubitschek parou seu veículo no local provavelmente para descansar, sendo que ficou no local aproximadamente trinta a quarenta minutos, segundo o senhor Gabriel Junqueira Villa Forte, filho do Brigadeiro Milton Junqueira Villa Forte.

Mencionada testemunha informou que já ocorreram diversos acidentes na curva onde os fatos ocorreram (fls. 92/111).

A prova colhida no processo em que o motorista Josias Nunes de Oliveira foi réu era dúbia, e por isso ele foi absolvido por insuficiência de provas para sua condenação, o que não pode ser confundido com absolvição por estar provado que o réu não concorreu para a infração penal, sendo ambos dispositivos diversos e previstos no artigo 386, do Código de Processo Penal.

Várias testemunhas informaram que não houve colisão entre o ônibus e o veículo dirigido por Geraldo Ribeiro. Nesse sentido foram os depoimentos das testemunhas Paulo Olivier (fl. 140), Guilherme Jorge Habib (fl. 224), e José Maria, que observou que o automóvel derrapou (fl. 226), e Ângela Maluf (fl. 227), e Nazile José Maluf (fls. 245-v).

Danilo Martins de Lima não sentiu a batida e nem ouviu comentários a seu respeito (fl. 233).

A testemunha ouvida à fl. 234-v, que não consegui identificar o nome, uma vez que a requerente juntou documentos fora de ordem e incompletos, “achou” que o ônibus não bateu no opala.

A testemunha ouvida à fl. 237 informou que não sentiu impacto no ônibus.

Em sentido contrário foram os depoimentos a seguir analisados.

José Taboada Carbalo informou que o motorista conduzia o ônibus com velocidade acima do normal, e disse que verificou vestígios de tinta escura na carroceria do ônibus, na parte dianteira esquerda, mais precisamente acima do farol, e que antes da freada violenta o motorista do ônibus desviou o coletivo para esquerda, naturalmente com o intuito de fazer uma ultrapassagem (fl. 229-v).

À fl. 231-v, foi juntada cópia de um depoimento incompleto de uma testemunha que informou que o motorista do ônibus imprimia velocidade excessiva ao veículo antes do acidente, e que ele continuou se portando assim depois do acidente, sendo que se dirigiu ao local onde o motorista estava e chamou a sua atenção.

À fl. 223, cujo depoimento presumo que seja a continuação do depoimento de fl. 231-v, a testemunha ouvida informou que o ônibus se envolveu no acidente, e que ela se dirigiu para a rodoviária e reclamou do comportamento do motorista.

À fl. 243 foi juntado um depoimento da 2ª testemunha (não identificada), que informou que ouviu um barulho de raspar, não sabendo informar se a carroceria ou o ônibus bateu no meio fio, sendo que em seguida houve freadas sucessivas.

Apesar da absolvição do acusado, a Comissão Nacional da Verdade concluiu que o ônibus colidiu com o Opala, com base nas investigações realizadas e nas provas colhidas.

À fl. 253, o laudo concluiu que o veículo que levava o Presidente Juscelino foi abalroado por um veículo não identificado, antes de colidir com a Scania. Mencionado laudo foi considerado pela Comissão Nacional da Verdade à fl. 432.

Nas investigações realizadas, concluiu-se pela suspeição de que o ônibus da Viação Cometa havia participado do acidente (fls. 257 e 433).

No laudo acostado à fl. 260, constatou-se que o veículo Opala tinha arranhaduras múltiplas e bastante pronunciadas, na ponta recurva da extremidade esquerda do para-choque traseiro, notadamente, no ressalto circular da cabeça do parafuso de fixação.

À fl. 261, constatou-se que o ônibus tinha arranhaduras pronunciadas e amolgamentos pouco expressivos, com desenvolvimento da dianteira para traseira, interessando, essencialmente, o ângulo direito do para-choque dianteiro e a dobradiça inferior da porta de embarque.

Caso fosse verdadeira a tese de que o ônibus bateu numa pilastra da rodoviária, a dobradiça inferior da porta de embarque do ônibus não seria atingida.

À fl. 263, concluiu-se que no decorrer do engajamento, devido ao seu maior porte, o ônibus foi colocando parte de seu peso sobre o Opala, rebaixando gradativamente a carroceria deste, daí se originando o perfil ascendente da avaria do para-lama.

A conclusão do laudo de fls. 271/272 foi no sentido de que houve a colisão tangencial do setor dianteiro do auto-ônibus com o para-lama traseiro esquerdo do Opala, e que a colisão tangencial se deveu à imprudência do condutor do coletivo, ao desenvolver velocidade superior ao limite permitido para o local.

A Comissão Nacional da Verdade ouviu o Inspetor Sydnei Ramos Pimentel, que disse que três pessoas que se identificaram como sendo passageiros do ônibus disseram que ele havia batido no Opala (fl. 440).

A requerente juntou depoimentos incompletos, sendo que deixou de juntar a página 18 da sentença absolutória do motorista do ônibus, acostada às fls. 153/171.

Às fls. 514/516 foi realizado exame de justaposição de tintas, que identificou que houve colisão entre o ônibus da Viação Cometa e o Opala, o que também foi constatado no laudo acostado às fls. 434/435.

À fl. 515 foi juntada fotografia das avarias do opala, que não foram consignadas no laudo, conforme laudo do perito contratado pela Viação Cometa, que contestou o levantamento e a análise pericial decorrentes dos laudos produzidos pelo Instituto Carlos Éboli (fls. 435/436).

No relatório dos peritos João Bosco de Oliveira e Ventura Raphael Martello Filho, que atuaram pela Comissão Externa da Câmara dos Deputados destinada a apurar os fatos, eles concluíram que havia uma avaria no para-lama dianteiro esquerdo do Opala, sobreposta por marca em forma de arco disposto horizontalmente e com impregnação de material de matiz escuro, sugerindo ter sido produzida por rodagem de veículo de maior porte, muito provavelmente resultante de contato com a rodagem dianteira direita do coletivo. Eles concluíram também que não houve substituição de peritos (fl. 438).

À fl. 450, a Comissão Nacional da Verdade concluiu que houve uma colisão entre o ônibus e o Opala.

Às fls. 282/289 foi juntado laudo da exumação de Geraldo Ribeiro, onde se concluiu à fl. 284 que o fragmento encontrado era de prego enferrujado e corroído, e no exame complementar radiológico se constatou que não foram observadas imagens de densidade radiológica elevada, sugestiva de projéteis de arma de fogo, sendo que as radiografias foram registradas sob o número 6942. À fl. 437 se concluiu a mesma coisa, e que não houve explosão.

Ao ser ouvido pela Comissão Nacional da Verdade, o Patrulheiro Lafaiete Costa Bacelar, não fez nenhum relato sobre lesão produzida por projétil de arma de fogo na cabeça de Geraldo Ribeiro (fl. 440).

Em seu depoimento prestado na Câmara dos Deputados, o patrulheiro João Bernardo de Souza declarou que ajudou a retirar o corpo de Geraldo Ribeiro do veículo, e negou que havia orifício na cabeça de Geraldo Ribeiro (fl. 442).

À fl. 443 foi juntada fotografia da cabeça de Geraldo Ribeiro no dia do acidente, onde se constata que ele não levou tiro no seu lado esquerdo, sendo que tal fotografia foi acostada novamente à fl. 523. Mencionada fotografia foi corroborada pela fotografia do crânio dele acostada na mesma página e também à fl. 452 e à fl. 521.

Constatou-se também por intermédio de exame químico que o fragmento encontrado era um fragmento de prego enferrujado e corroído (fl. 287).

No mencionado laudo também se constatou a ausência de sinais de traumatismo ósseo por projétil de arma de fogo (fl. 289). Tal laudo foi assinado por dois médicos legistas e por dois odonto-legistas do IML.

A Comissão Nacional da Verdade concluiu após a realização de imagens radiológicas e pelo exame de Espectrofotometria de Absorção Atômica aos quais os fragmentos decorrentes da fratura foram submetidos, de que o crânio de Geraldo Ribeiro não foi atingido por projétil proveniente de disparo de arma de fogo (fl. 453).

Juscelino Kubitschek também não foi atingido por disparo de arma de fogo, e Gil Castelo Branco mandou radiografar todo o seu corpo (fl. 127).

A única versão nos autos de que houve uma Caravan emparelhada ao carro Opala foi oriunda de uma reportagem acostada à fl. 214, sendo que não foi juntado nenhum depoimento nesse sentido.

Se esse veículo existisse e realmente tivesse emparelhado ao Opala, primeiro ele teria que ultrapassar o ônibus da Viação Cometa, sendo que nenhum passageiro do ônibus viu esse veículo, e depois da ultrapassagem, o disparo poderia ter sido efetuado. Nenhum atirador de elite escolheria uma curva para efetuar o disparo de dentro ou de fora de um veículo.

Se esse disparo fosse efetuado de dentro da Caravan, ele acertaria o lado esquerdo do crânio de Geraldo Ribeiro, como bem ponderou a Comissão Nacional da Verdade à fl. 460.

A margem da via era imprópria para a prática de um atentado, conforme apurou a Comissão Nacional da Verdade (fl. 535).

Foram realizadas fotografias do fragmento dentro do crânio de Geraldo Ribeiro (fl. 454), que foi analisado nos laudos acostados às fls. 448 e 459, que compararam o mencionado fragmento com projétil de calibre 38.

Paulo Olivier informou para a Comissão Nacional da Verdade que o clarão que viu ocorreu quando da colisão do Opala com a Scania.

À fl. 441 a Comissão Nacional da Verdade questionou as alegações de Alberto Carlos de Minas.

As fotografias não sumiram, conforme ele havia alegado.

Geraldo Ribeiro não foi enterrado no Cemitério do Caju por quinze anos, conforme ele alegou à fl. 465.

Os negativos do dia do acidente foram encontrados pela Comissão Nacional da Verdade, e não foram destruídos, conforme Alberto Carlos de Minas alegou às fls. 474 e 479.

O fragmento que Alberto Carlos de Minas alegou ter desaparecido foi encontrado no Município de Resende, RJ, e periciado pela Comissão Nacional da Verdade.

A Comissão Nacional da Verdade e a Comissão presidida pelo deputado Paulo Octávio, casado com a neta do Presidente Juscelino Kubitschek, concluíram que não houve substituição dos peritos.

Há tantas versões fantasiosas sobre o caso, que Alberto Carlos de Minas disse que ouviu dizer que a filha do motorista recebeu dinheiro para ficar quieta (fl. 488).

Se os fatos alegados pela requerente estivessem de acordo com a realidade, estaríamos diante da maior conspiração existente na História deste País para matar um Presidente da República e seu motorista, e para acobertar os autores do crime.

Primeiro o Presidente teria que ter sido atraído ao local por um conhecido, com o qual havia sobrevoado a região de Brasília nos anos quarenta.

Depois ele seria emboscado ou por um veículo com um atirador, ou por um atirador que ficaria escondido, para atingir o motorista Geraldo Ribeiro, em plena curva, num local totalmente impróprio para um atentado.

Depois teriam que combinar com o motorista da Scania, para que seu veículo colidisse com o Opala.

Em seguida, teriam que ser auxiliados pelos policiais rodoviários, pelos peritos e por seus chefes, pela Polícia Civil de dois Estados da Federação, pela Polícia Federal, pelo Exército e pelos diversos populares que foram ao local do acidente.

Ressalte-se que a Polícia Civil de Minas Gerais e a Polícia Federal deveriam aderir à conspiração em pleno período democrático, e no período em que o senhor Serafim Jardim era o Chefe de Gabinete do Governador Eduardo Azeredo, que havia autorizado a apuração dos fatos.

À conspiração deveriam aderir as filhas do senhor Geraldo Ribeiro, que receberiam dinheiro para que ficassem quietas, bem como o Deputado Paulo Octávio, casado com uma das netas do Presidente Juscelino Kubitschek.

As duas Comissões também deveriam aderir também a essa conspiração. A presidida pelo Deputado Paulo Octávio e que era composta por 22 deputados e a Comissão Nacional da Verdade, para que fossem mantidas as apurações ocorridas no ano de 1976.

No relatório da Comissão presidida pelo Deputado Paulo Octávio (fl. 445), concluiu-se que:

. as características do local não favoreceriam uma tentativa de assassinato.

. não há vestígios de explosão.

. não houve substituição de peritos.

A Comissão Nacional da Verdade investigou as circunstâncias do acidente e das mortes, ouviu testemunhos, fez pesquisas documentais, diligências e perícias, enumeradas às fls. 419/423.

A Comissão Nacional da Verdade concluiu que:

. houve uma colisão lateral com o ônibus (fl. 423).

. a cabeça de Geraldo Ribeiro não foi atingida por um projétil de arma de fogo.

. o fragmento metálico que se encontrava no crânio de Geraldo Ribeiro era um cravo metálico, utilizado para fixar o revestimento de caixões.

. não há nos documentos, laudos e fotografias trazidos para análise, qualquer elemento material, que sequer sugira que o Presidente Juscelino e Geraldo Ribeiro tenham sido vítimas de homicídio doloso.

O que ninguém explicou até o presente momento é o motivo pelo qual saíram procurando o motorista do veículo da Viação Cometa, pois se quisessem acobertar o crime, nunca procurariam o ônibus, conforme concluíram os peritos João Bosco de Oliveira e Ventura Raphael Martello Filho, que inclusive concluíram que o ônibus estava em velocidade excessiva (fl. 439).

As incongruências apontadas pela Comissão Municipal da Verdade Vladimir Herzog vão de encontro às provas carreadas aos presentes autos.

A verdade sempre deve ser buscada, e não é verdadeira a alegação de que a Comissão Nacional da verdade praticou dano moral contra o motorista Josias, e é fantasiosa a alegação de que ela buscou revogar unilateralmente a coisa julgada.

A versão do motorista Josias de que foi procurado por dois homens cabeludos para que assumisse a autoria do acidente restou isolada no conjunto probatório, sendo que ele não fez nenhuma prova dos fatos alegados, fato que se realmente tivesse acontecido chamaria a atenção de seus vizinhos ou de outras pessoas.

A coisa julgada não atinge a quem não fez parte do processo. O que ocorre é que o motorista Josias não poderá ser condenado e nem julgado novamente pelos mesmos fatos, mas a verdade sempre pode e deve ser apurada.

Deve ser lembrada a lição de Geraldo Ribeiro a seus filhos, segundo Maria de Lourdes Ribeiro, quando disse a uma reportagem:

Eu até poderia pedir indenização do governo, mas meu pai me ensinou que a mentira prende e a verdade solta. Ele não levou um tiro”(fl.550).

No mesmo sentido foi a declaração do Deputado Paulo Octávio, para outro órgão de imprensa:

'Continuo com a mesma convicção. Não foi constatado nenhum atentado ou tiro. O que o matou foi a batida no caminhão. Ninguém provoca um acidente cronometrado. JK morreu por frações de segundo. Se o carro que ele estava cruzasse a pista um segundo depois, o caminhão não teria batido', conta. Ele garante que a comissão fez um trabalho estritamente técnico. Paulo Octávio ressalta que a família não quer mais saber do assunto, porque é doloroso.” (fl. 551).

A Câmara Municipal de São Paulo à fl. 556 informou que a exumação requerida é para apurar se Geraldo Ribeiro foi atingido por um disparo.

Não há que se falar em inversão no ônus da prova, pois a Comissão Externa da Câmara dos Deputados e a Comissão Nacional da Verdade instaladas em período democrático concluíram que não houve acidente, sendo que até o presente momento e com base na documentação acostada a estes autos, não existe um indício sequer que seja plausível de que Juscelino Kubitschek e seu motorista Geraldo Ribeiro tenham sido vítimas de homicídio, o que concluo analisando as provas carreadas aos autos.

Dei asas à minha imaginação e à minha criatividade após ler integralmente este processo, conforme sugerido pela Comissão presidida pelo Deputado Paulo Octávio, cujo relator foi o deputado Osmânio Pereira, e não encontrei nenhum elemento nestes autos que indicasse que o Presidente Juscelino Kubitschek e o senhor Geraldo Ribeiros foram assassinados.

A exumação do corpo de Geraldo Ribeiro é totalmente desnecessária, sendo que seu crânio está fraturado e a medida não teria nenhuma utilidade prática.

Como bem ponderaram suas filhas, os laudos, testes e fotografias produzidos para apuração dos fatos estão disponíveis para novas perícias, e não existe nenhuma nova evidência que demande nova apuração, e considerando que o objeto metálico encontrado no interior da calota craniana de Geraldo Ribeiro não está junto aos seus restos mortais.

O procedimento requerido apenas serviria para causar enorme sofrimento e dor para os familiares de Geraldo Ribeiro, e não teria nenhuma utilidade prática, razão pela qual indefiro o requerimento de exumação de seus restos mortais.

Condeno a requerente nas custas processuais e honorários advocatícios, que nos termos do artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, fixo em dez mil reais, devidos a partir da data da condenação, considerando o grau de zelo dos profissionais e a natureza e a importância da causa.

Renumerar os autos a partir de fls. 555, sendo que a folha juntada entre as fls. 555 e 556 deverá ser numerada com o número 555-A, e as duas folhas juntadas entre as fls. 557/558 deverão ser numeradas com os números 557-A e 557-B, para que não se prejudique a ordem das citações de páginas efetuadas nesta sentença, devendo a cópia de fac-símile ser substituída por cópia xerográfica.

Publique-se. Registre-se.

Intimem-se. Cumpra-se.

Belo Horizonte, 10 de junho de 2015.

Rinaldo Kennedy Silva

Juiz de Direito

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